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“O desenvolvimento econômico da América Latina e alguns de seus principais problemas”

PREBISCH, Raul (1949). “O desenvolvimento econômico
da América Latina e alguns de seus principais problemas”. Item II (“Os
benefícios do progresso técnico e os países da periferia”). In: BIELSCHOWSKY,
Ricardo. (org.)
Cinquenta anos de pensamento na CEPAL. vol. I. Rio de
Janeiro, Cofecon-Cepal; Record, 2000, pp. 80-88.
Para Prebisch a América Latina deve ser entendida como um
todo por conta de seu passado colonial e a formação dos países como primários
exportadores dentro da Divisão Internacional do Trabalho com a industrialização
do centro. Há para ele problemas comuns na América Latina:
I)                   
industrialização por substituição das importações
que imita as técnicas e produtos mais simples primeiro;
“Os imensos benefícios do desenvolvimento da produtividade
não chegaram à periferia numa medida comparável àquela de que logrou desfrutar
a população desses grandes países. Daí as acentuadíssimas diferenças nos
padrões de vida das massas destes e daquela, assim como as notórias
discrepâncias entre as suas respectivas forças de capitalização, uma vez que a
massa de poupança depende primordialmente do aumento da produtividade” (p. 72)
“Daí a importância fundamental da
industrialização dos novos países. Ela não constitui um fim em si, mas é o único
meio de que estes dispõem para ir captando uma parte do fruto do progresso
técnico e elevando progressivamente o padrão de vida das massas” (p. 72)
II)                 
não é possível a periferia passar pelas mesmas
etapas dos países do centro, uma ideia parecida com a de Trótski;
III)               
foco no setor primário que é exportador e não
pode ser substituído porque ele é o gerador de divisas;
“Quanto mais ativo for o comércio
exterior da América Latina, tanto maiores serão as possibilidades de aumentar a
produtividade de seu trabalho, mediante uma intensa formação de capital. A
solução não está em crescer à custa do comércio exterior, mas em saber extrair,
de um comércio exterior cada vez maior, os elementos propulsores do
desenvolvimento econômico” (p. 73)
IV)              
inadequação
tecnológica
e inadequação das
plantas
por conta do mercado estreito da periferia;
V)                
alto grau de dependência do investimento externo. As consequências para o Estado
é o endividamento externo e a criação da dívida pública e a estratégia para a
criação da poupança para o Estado, por meio de impostos e a conversão em
Investimento e não em Consumo;
“Ninguém discute que o desenvolvimento econômico de certos
países da América Latina e sua rápida assimilação da técnica moderna, em tudo o
que lhes possa ser proveitoso dependem em alto grau dos investimentos
estrangeiros. Esse problema não é nada simples por todas as implicações que
contém. Entre seus fatores negativos, convém relembrar, antes de mais nada, o
descumprimento dos serviços financeiros durante a grande depressão dos anos
1930.” (p. 75)
VI)              
política
monetária
: ideia de inflação não é dependente da política monetária. O
preço tem uma relação cm oferta e demanda e, como Hirshman, é fruto dos
estrangulamentos dessa economia. Dizer que esse problema é estrutural é ligar
os preços ao estrangulamento;
VII)            
Formação
de capital
: têm-se uma baixa produtividade, baixos salários, renda e
mercado estreito, assim como Nurkse e o ciclo da estagnação; e pelo salário e
incapacidade de poupar é o ciclo da pobreza. Prebisch concorda com Lewis que a
formação de capital vem da classe capitalista;
“Na maior parte dos países latino-americanos, a poupança
espontânea é insuficiente para cobrir suas necessidades mais prementes de
capital” (p. 76)
“A elevação do padrão de vida das massas depende, em última
instância, de uma expressiva quantidade de capital por trabalhador empregado na
indústria, nos transportes e na produção primária, e da capacidade de bem
administrá-lo. (…) a formação de capital tem que lutar contra uma tendência
muito acentuada a certas modalidades de consumo, que muitas vezes se mostram
incompatíveis com um grau elevado de capitalização” (p. 76)
“O crescimento do emprego
requerido pelo desenvolvimento industrial pôde efetuar-se, embora não na
totalidade dos casos, com a utilização de pessoas que o progresso da técnica
vinha desalojando
da produção primária
[AC1] e
de outras atividades, especialmente de certos tipos de trabalhos e serviços
pessoais de remuneração relativamente baixa, e mediante a utilização do
trabalho feminino. O emprego industrial das pessoas desempregadas ou mal
empregadas significou, portanto, uma melhoria da produtividade, que se traduziu
num aumento líquido da renda nacional, nos casos em que não houve fatores de
outra natureza que provocassem uma queda geral da eficácia produtiva” (p. 77).
VIII)          
Inflação: para Prebisch é estrutural e não
monetária e temporária como dizia Lewis;
IX)               
Caráter
da política anticíclica
“Quanto a esse aspecto, é
necessário definir com precisão o objetivo que se persegue através da
industrialização. Quando ela é considerada como o meio para atingir um ideal de
auto suficiência, no qual as considerações econômicas passam para segundo plano,
qualquer indústria que substitua importações torna-se admissível. Se o
objetivo, no entanto, é aumentar aquilo que com acerto se denominou de bem-estar mensurável das masas, é
preciso ter em mente os limites além dos quais uma industrialização maior poderia
significar uma quebra da produtividade.” (p. 78)
Prebisch cita três limites para a
industrialização na periferia. O primeiro é a elevação do nível de salários
para uma correção do desequilíbrio da renda entre centro e periferia. “Outro
desses limites é dado pelas considerações relativas à dimensão ótima das empresas industriais. Nos países da América
Latina, de um modo geral, vem-se procurando desenvolver, do lado de cá da
fronteira, as mesmas indústrias existentes do lado de lá. Isso tende a diminuir
a eficiência produtiva e conspira contra a consecução do objetivo social
buscado” (p. 79) e “A possibilidade de que se venha a inutilizar uma parte
importante do fruto do progresso técnico em função de um fracionamento
excessivo dos mercados é, portanto, outro dos limites do desenvolvimento
industrial de nossos países” (p. 79).
II. Os benefícios do progresso técnico e os países da periferia
Progresso técnico beneficiou
principalmente os países centrais e na periferia “parece” ter sido mais
acentuado no setor primário exportador que na indústria. Considerando a
movimentação de preços durante as crises e durante a segunda guerra mundial,
Prebisch formula considerações:
“Primeiro: os preços não baixam
de acordo com o progresso técnico, pois enquanto, por um lado, o custo tendeu a
baixar em virtude do aumento da produtividade, por outro, elevou-se a renda dos
empresários e dos fatores produtivos.” (p. 83)
Segundo: o crescimento da renda
foi desproporcional ao aumento das produtividades o que gera diferença na relação
de preços entre produtos primários e industriais.
Terceiro: historicamente a
relação se deslocou desfavoravelmente aos produtos primários entre 1870 e 1930
por conta de crises e aumento de produtividades maior na indústria e no centro
por elevação mais acentuada no padrão de vida do centro sustentado pelos países
periféricos que compraram produtos manufaturados.
“Enquanto os centros preservaram
integralmente o fruto do progresso técnico de sua indústria, os países
periféricos transferiram para eles uma parte do fruto do seu próprio progresso
técnico” (p. 83)
“Seria impossível compreender a
razão desse fenômeno sem relacioná-lo com o movimento cíclico da economia e com
a forma como ele se manifesta nos centros e na periferia, porque o ciclo é a forma
característica do crescimento da economia capitalista, e o aumento da
produtividade é um dos fatores primordiais do crescimento. No processo cíclico,
há uma disparidade contínua entre a demanda e a oferta globais de artigos de
consumo produzidos nos centros cíclicos. Na fase ascendente, a demanda
ultrapassa a oferta e na descendente ocorre o inverso” (p. 86)
Ocorre uma transferência de lucro
entre centro e periferia, ou seja, quanto maior a demanda e menor a capacidade
de ofertar, maiores os preços e maior o lucro do centro é gasto com produtos
primários. O problema todo está na incapacidade de correção da disparidade
entre oferta e demanda nos diferentes momentos do ciclo e a incapacidade de
negociação e defesa dos salários na periferia. Por conta dos salário e do poder
sindical no centro, a pressão por proteção dos lucros dos capitalistas e
proteção do padrão de vida dos trabalhadores, ambos no centro, se desloca para
a periferia onde os preços dos produtos exportados são mais elásticos por conta
da capacidade de variações no salário.
III. A América Latina e a alta produtividade dos Estados Unidos
A mudança do centro cíclico
mundial da Grã-Bretanha para os Estados Unidos teve um papel importante por
conta do desenvolvimento da sua produtividade. “Os países da América Latina,
com um alto coeficiente do comércio exterior, são extremamente sensíveis a
essas repercussões econômicos” (p. 88)
Os Estados Unidos chegaram a
coeficientes baixos de importação por conta do seu progresso técnico. “Ainda
que isso pareça paradoxal, o aumento da produtividade contribuiu para que
aquele país prosseguisse em sua política protecionista e a acentuasse, depois
de atingir a etapa de maturidade econômica” (p. 90)
“Quando o centro principal
contrai sua renda, na fase cíclica minguante, ele tende a propagar essa
contração para o resto do mundo. Quando a renda deste último não  diminui simultaneamente e com a mesma
intensidade, mas o faz com certo atraso, surge um desequilíbrio na balança de
pagamentos: o centro, por diminuir sua renda mais depressa, também restringe
suas importações e demais parcelar passivas com mais intensidade do que o resto
do mundo, com o que este se vê forçado a lhe enviar outro” (p. 95)


 [AC1]Lewis
abordou o mesmo processo em 1954 ao tratar da oferta ilimitada da mão-de-obra e
a necessidade de investir na técnica do setor primário para liberar
trabalhadores para o setor de bens de capital em países pouco populosos.

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