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A dinâmica da acumulação de capital entre 1919 e 1929

AURELIANO, L. M. (1976) No limiar da industrialização. 2ª ed.
Campinas, SP: Unicamp, IE. 1999. Cap. I: “A crise da economia exportadora
capitalista: a dinâmica da acumulação…” (pp. 15-54)
A crise de 1929 representou a
precipitação da crise da economia exportadora capitalista por meio das
condições de negação do sistema predominante até então criadas em seu interior.
É uma crise mais longa dada a superacumulação interna e a violenta contração da
demanda externa.
Na década de 1920 criam-se as condições
para o capital industrial aspirar a um dinamismo próprio. É nesse período que o
setor produtor de bens de consumo assalariado se moderniza por conta da
concorrência externa. Além disso, há internamente um setor agrícola mercantil
que foi capaz de sobreviver e romper com a dependência das importações já no
período da Primeira Guerra Mundial. Aureliano aponta esses dois pontos como
significados da plenitude do desenvolvimento da economia exportadora
capitalista e de suas potencialidades.
“o desenvolvimento e a diversificação da
indústria de bens de produção marcam a crise estrutural da economia exportadora
capitalista, ainda que estivéssemos atravessando um momento de expansão sem
precedentes do capital cafeeiro” (p. 17)
O setor cafeeiro passa por séria crise
entre 1898 e 1906, momento no qual proprietários de terras menos férteis são
eliminados e o Estado coloca em prática a Política de Valorização do Café para
impedir o aprofundamento da cise. Após anos de estagnação, o setor se defronta
com nova expansão entre 1910 e 1913, até, portanto, a Primeira Guerra Mundial
e, posteriormente, um novo período positivo entre 1919 e 1929. Como ilustração
desse momento de prosperidade, de acordo com a autora, a receita da exportação
média passa de 527 mil entre 1910 e  1918
para 2 milhões nos dez anos seguintes. Na euforia dos lucros crescentes, além
de forte expansão extensiva da produção, terras de regiões onde a produção
havia desaparecido voltaram a ativa.
A imigração, que cessa nos momentos de
crise, volta a crescer durante três períodos distintos entre 1916 e 1930. As
migrações internas também tomam fôlego, motivadas também pela secas na década
de 1920 no setor de subsistência nordestinos. A reprodução ampliada da força de
trabalho ocorreu, no entanto, sem elevação de seu valor explicado pela oferta
no mercado de trabalho e também pelo desemprego da agricultura mercantil de
alimentos e do setor industrial de bens de consumo assalariado.
As condições de realização do café são
beneficiadas pela prosperidade das economias importadoras na década de 1920,
especialmente os Estados Unidos, devido ao aquecido setor automobilístico e da
construção civil. A participação das importações norte-americanas no mercado do
café sobem de 50% em 1920 para 60% em 1929.
A participação do estado e as
valorizações do café foram fundamentais nesse período. Entre 1925 e 1929, uma
mudança no caráter da política, agora de Defesa Permanente, assegura os preços
elevados e sua manutenção. O problema desse aquecimento é o aumento gigantesco
das safas na segunda metade da década.
Liana cita JMCM: “as vicissitudes do
complexo cafeeiro explicam-se, antes de mais nada, pelas contradições do
processo de acumulação do capital cafeeiro, suavizadas e, simultaneamente,
aprofundadas pela Política Econômica do Estado” (p 25)
O
desenvolvimento da agricultura comercial de alimentos
A relação entre o sustento da força de
trabalho e a importação de alimentos diminuíra muito a partir de 1915 quando o
país conquista sua quase total auto-suficiência na produção de bens de consumo
assalariados, impulsionado, principalmente, pelo estado de São Paulo. A crise
entre 1898 e 1910 foi responsável por transformar o tímido comércio nas ruas
dos cafezais em um setor produtivo independente.  O capital procurou novas oportunidades de
investimento quando a rentabilidade do café estava em baixa e encontrou
conforto na produção de alimentos estimulada pelo crescimento da demanda a
partir de 1915 e pelo protecionismo estabelecido em 1905. Além de São Paulo,
outros estados diversificam a agricultura como Minas Gerais com gado, leite e seus
derivados, e Rio Grade do Sul com charque, banha, fumo e feijão, ambos vendiam
no mercado interno.
“As razões de bloqueio no Nordeste são
fáceis de atinar e podem ser ditas numa palavra: baixo grau de divisão social
do trabalho e, consequentemente, fraco desenvolvimento das relações de produção
capitalistas” (p. 28)
O
desenvolvimento industrial
Aureliano assume que o nascimento do
capital industrial se dá entre 1886 e 1897 por meio da indústria de bens de
consumo assalariado. As barreiras para o desenvolvimento da indústria
brasileira estão nas pesadas exigências de escala mínima e de investimento nos
setores de siderurgia, química e eletromecânica que marcam a etapa do
capitalismo monopolista. Se impõem, portanto, grandes limitações uma vez que o
país deveria adotar processos produtivos do Centro, mas com condições mínimas
parecidas com as do mesmo centro, condições essas que não estavam dadas no
Brasil do começo do século XX principalmente por conta do desenvolvimento das
forças produtivas, da tecnologia e do tamanho do mercado interno existente – ou
praticamente inexistente em termos de integração. Quanto ao mercado, ele era
restringido às áreas litorâneas com altos custos de transporte. Já na questão
tecnológica, grandes plantas exigiam energia elétrica e investimentos iniciais
elevados. A inexistência de um setor produtos de bens de capital coloca graves
limites à reprodução simples e ampliada do capitalismo brasileiro restringindo
a economia à economia exportadora. Além do mais, o primeiro setor a se instalar
no brasil, o têxtil, é marcado pela grande empresa e de caráter oligopólico,
sem conhecer a concorrência.
Apesar das baixas taxas de crescimento
industrial entre 1919 e 1929, as importações de máquinas nesse período mostram
a modernização do setor de bens de consumo assalariado. Como esse setor já era
bem constituído em 1920 e atendia devidamente a demanda, ele poderia registrar
desequilíbrios entre taxa de lucro e taxa de crescimento da demanda e o perigo
da sobreacumulação permanente rondava o setor a medida que o complexo
exportador cafeeiro evoluía.
“À medida que a taxa de crescimento do
mercado, especialmente nos estados não-cafeeiros, é inferior à taxa de
acumulação, a concorrência intercapitalista vai se aguçando cada vez mais,
dando, a cada passo, maior ímpeto à modernização e, com isto, aprofundando o
desequilíbrio entre ampliação da capacidade produtiva e expansão do mercado”
(p. 43)
Apesar de ser afetada pela crise
cafeeira em 1921, a indústria de bens de consumo assalariado, especialmente a
têxtil, cresce entre 1922 e 1923 ao utilizar sua capacidade ociosa. Já entre
1924 e 1926, com diminuição da proteção e a expansão da demanda diminuída a
concorrência intercapitalista se torna mais violenta e toma um caráter
inter-regional culminando em crise industrial no último ano desse período,
seguida por crescimento da produção entre 1927 e 1928 devido à retomada da
proteção e da demanda cafeeira. Essa trajetória, no entanto, não é seguida por
todos os departamentos da indústria. Há diversificação dentro do setor de bens
de consumo assalariado e crescimentos regionais, especialmente o paulista,
maiores que o nacional.
No setor de bens de produção também
houve significativas evoluções na década de 1920. Surgem nessa década: a
pequena indústria de aço, de cimento, de motores elétricos, de máquinas para a
indústria do açúcar, de máquinas têxteis, entre outras. Esse setor adquire
grande importância para o futuro da indústria se tornando condição fundamental
para a reprodução independente do capital mercantil exportador.
1924: Companhia Brasileira de Cimento
Portland – capitais canadenses e norte-americanos. Incentivos governamentais
foram importantes atrelados às empresas que produzissem um mínimo de toneladas
especificado e utilizasse matéria-prima e combustíveis nacionais: isenções de
taxas aduaneiras sobre máquinas e equipamentos, isenções de impostos de
consumo, tarifas especiais nos meios de transportes nacionais, e empréstimos.
A partir de 1917 o Estado passa a
incentivar a indústria do aço após o fracasso na tentativa de instalação no
país e das dificuldades trazidas pela Primeira Guerra Mundial. Vantagens
relacionadas a tarifas mais baixas e isenções de direitos de importações foram
concedidas aos empresários e prorrogadas em 1921. A instalação da Companhia
Belgo-Mineira, foi marco fundamental desse setor. A pequena indústria do aço
estimulou a criação de novas empresas integradas verticalmente.
O desenvolvimento desse departamento
denota que a economia exportadora capitalista atingira a plenitude de suas
potencialidades gerando um movimento de negação de sua essência. Contudo, esse
movimento estava limitado por barreiras econômicas e políticas.
“A emergência do embrião do departamento
de meios de produção é possível somente porque o capitalismo atinge, no Brasil,
um grau relativamente avançado de desenvolvimento. Melhor ainda, é o sinal de
que a economia exportadora capitalista havia levado até a plenitude suas
potencialidades, sobrepassando-as mesmo, ao gerar, no seu movimento, algo de
essencialmente contraditório com o padrão de acumulação que lhe era próprio”
(p. 50)
Ocorre ainda tentativas de instalação da
indústria siderúrgica pesada. Privilégios foram concedidos à Itabira Iron, de
Percival Farquhar, para transformar a empresa numa usina siderúrgica
exportadora de minérios. Entre estes incentivos estavam monopólio do transporte
ferroviário, direito ad aeternum de
uso de um porto na costa, direito de expropriação de terras nas margens nas
ferrovias, isenção de tributos e de impostos de consumo. A oposição foi forte
por parte de Minas Gerais.
Do estudo desse período a autora chega a
três principais entraves (que ela chama de lições): incapacidade de o
empresariado nacional de enfrentar problemas de mobilização e concentração de
capitais; era preciso enfrentar o desinteresse do capital internacional; havia
estreitos limites da atuação do Estado e a incapacidade de assumir a tarefa de
desenvolvimento da indústria siderúrgica.

“Em suma, o problema da siderurgia
pesada era inteiramente prematuro na década de 20, porque não encontrava
respaldo nem nas necessidades de reprodução do capital mercantil exportador,
nem em interesses suficientemente fortes que pudessem conformar a política
econômica do Estado. Serão necessárias a mudança do padrão de acumulação e uma
nova estrutura de poder, num momento de crise do capitalismo mundial, para que
a questão siderúrgica entre, realmente, na ordem do dia” (p. 54)

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